A fuga que se adivinha
Apesar de, nos últimos meses, a questão dos refugiados não ter estado em foco nas agendas mediáticas, há migrantes que continuam a arriscar a vida no Mediterrâneo à procura de paz.
Com a crise no Afeganistão, o fluxo terá tendência a aumentar. Se, numa primeira fase, Portugal vai receber 50 pessoas que de uma forma ou de outra colaboraram com a NATO e a União Europeia, é muito provável que algumas das pessoas que por estes dias se amontoam junto ao aeroporto de Cabul cheguem nas próximas semanas à costa da Europa a precisar da nossa solidariedade.
Não nos podemos apenas comover com as imagens de bebés a passarem para as mãos de soldados, na ânsia de os salvar; é necessária essa mesma sensibilidade quando chegarem as barcaças às praias europeias. Na última crise migratória, alguns líderes ocidentais, como Angela Merkel, deram o exemplo e souberam acolher quem chegou à nossa porta. É necessário que os atuais saibam estar à altura do desafio que se segue.
O primeiro passo de, pelo menos, não deportar afegãos foi tomado por alguns países, como Bélgica, Finlândia, França, Alemanha, Suécia, Suíça, Dinamarca, Irlanda, Holanda e Noruega, mas, por exemplo, a Turquia e a Grécia optaram pela lei do muro e arame farpado. Num tempo de demagogia, com o perigo da extrema-direita a espreitar a cada esquina, é necessário que haja líderes fortes, com coragem para enfrentar as campanhas de desinformação contra quem chega, e que saibam desviar-se desta retórica anti-imigração, que tenta demonizar o acolhimento de refugiados.
Nas redes sociais, as contas ligadas a estes movimentos políticos já se começaram a mexer, para criar uma sensação de insegurança e gerar a ideia de que a Europa será “invadida”. Estejamos atentos e não nos deixemos enrolar por esta retórica fácil. Se não for pelo sentido humanista, que seja apenas pela necessidade que a Europa tem de combater o inverno demográfico.
Recordo um texto do “The Guardian” do ano passado, com histórias de sucesso na integração dos refugiados que pediram ajuda à Alemanha entre 2015 e 2019. Dez mil jovens aprenderam alemão a um nível de excelência e entraram na universidade; mais de metade das pessoas que chegaram estavam a trabalhar e pagavam impostos; 80% tinham um sentimento de pertença ao país. Por outro lado, os temores sobre terrorismo nunca se confirmaram. Daqui a um mês, Merkel sairá de cena e será escolhido um sucessor na liderança da maior economia europeia, mas ainda falta saber que influência terá esta crise já nesse ato eleitoral.